segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Entrevista: Frei Betto a revista Muito (Grupo A Tarde) - Natal, Ciência e Tolerância Religiosa

Paz seja com todos!
Antes de sofrer qualquer ataque por ser protestante e publicar alguns trechos da entrevista desta nobre personalidade, deixo claro que assim o faço pois intolerância religiosa não é do meu feitio. Achei interessante algumas colocações de Frei Betto que é de grande valia para vida de qualquer pessoa seja qual for o seu credo. Mas quem é Frei Betto?

Sobre Frei Betto e Entrevista
Nada da tradicional sisudez dos religiosos que nao ousam questionar: dogma parece ser palavra inexistente em seu dicionario.
Com Frei Betto, 67, a naturalidade e um dom. Bastante tranquilo, ele discorre sobre os mais diversos temas, de politica a religiao, mas não sem propriedade. 0 frade dominicano já atuou  como assessor especial do ex-presidente Lula, coordenador de mobilização social do programa Fome Zero e até como assistente de direção na montagem de o Rei da Vela, de 1967, de José Celso Martinez Correa. Passou pela repressão durante o regime militar e apoiou a Ação Libertadora Nacional (ALN), comandada por Carlos Marighella. Com mais de 50 livros editados nos mais diversos gêneros, Frei Betto ganhou 0 Premio Jabuti duas vezes, em 1982 (com Batismo de Sangue) e em 2005 (com Tipicos Tipos).
Nesta entrevista a Muito, ele aproveita a proximidade do Natal para falar sobre espiritualidade, tolerância religiosa, ateísmo e a relação entre ciência e sobrenatural. E avisa: "A religião é uma faca de dois gumes, pode servir tanto para libertar quanto para oprimir".

Revista Muito - 0 Natal representa 0 nascimento de Jesus, mas, cada vez mais, também a corrida aos shopping centers em busca do presente. Ainda há quem lembre do motivo original da festa ou isto perdeu importância diante do consumismo?

Frei Betto - Cada vez mais 0 Menino Jesus, que é quem dá sentido a festa, é escanteado, enquanto 0 Papai Noel, que é o símbolo do consumo, ocupa o lugar central. Isso traz um sentimento de infelicidade na corrida pelo presente: você tem que presentear quem você nem gosta ou mal conhece. Além disso, é ruim para as crianças que não conhecem 0 sentido do Natal. Vou te dar um exemplo: tenho amigos que vieram me perguntar outro dia 0 que fazer para que seus filhos de 15, 16 anos conhecessem os valores de Jesus. Eu disse: 'Tem ao menos uns 15 anos de atraso nessa decisão. Se eles tivessem sido educados com valores religiosos, aos 95 anos eles ainda se lembrariam do que aprenderam'.

Revista Muito - E as pessoas tem sentido falta de algo em que acreditar?

Frei Betto - Vejo que há muita inquietude espiritual. Vou te dar o exemplo mais radical, que é o aumento do consumo de drogas. Todo viciado é um místico em potencial. Por ter descoberto que a felicidade está dentro de si, e não fora, ele busca ansiosamente esta felicidade subjetiva. O detalhe é que ele ingressa pela porta errada, a do absurdo, quando seria muito feliz se entrasse pela do absoluto. O crescimento do consumo é a maior prova de que as pessoas estão procurando desesperadamente a espiritualidade, mas ainda carecem de orientação, porque ainda não descobriram o caminho correto, mas querem transcender, fazer uma experiência de êxtase. A vida mística traz isso.

Revista Muito - Que relação o senhor acredita entre os progressos científicos e a fé? Os progressos tecnológicos afastam o homem de sua espiritualidade?

Frei Betto - Acho que a ciência é uma benção de Deus, porque ele nos dotou de inteligencia para entendermos melhor o primeiro livro que ele escreveu: a natureza. O fato de ser rápido é uma vitoria da inteligência humana, a ciência procura desvendar como o universo surgiu. Enquanto isso, a fé procura o porque. São dimensões autônomas que devem dialogar entre si, sem uma procurar absorver a outra. O próprio amor é um ato de fé, e daí vem fidelidade e confiança. Assim, ninguém é totalmente sem fé, nem mesmo quem se define como ateu.

Revista Muito - O senhor nunca se refere a necessidade de religião, mas de espiritualidade. Como o senhor pensa a questão da tolerância religiosa, uma vez que ainda assistimos a tantas manifestações de intolerância cia no Brasil e no mundo?

Frei Betto - Deus não tem religião. Não tem sentido ficar brigando e afirmando que minha religião é melhor que a sua, que a sua é do demônio. Isso não é coisa de Deus, é de arrogância humana. Temos que respeitar as formas diferentes de fé, inclusive quem não tem fé... Nosso dever é amar as pessoas, não por professarem a mesma fé que tenho ou desejo ter. Esse desprendimento é nítido em Jesus, que, contrariando os apóstolos, fez curas na mulher cananéia, que não professava a mesma fé que ele. A mesma coisa que ele fez quando curou o servo do centurião romano. Jesus tinha uma abertura de coração enorme que a gente ainda não aprendeu.

Revista Muito - O que o senhor pensa sobre religiões ou líderes religiosos que mercantilizam a fé de seus fieis, vendendo a salvação e o perdão divino?

Frei Betto - A religião é uma faca de dois gumes, pode servir para libertar quanto para oprimir. Vejo muito padre ou pastor dizendo que Jesus é o caminho, mas fazem questão de cobrar o pedágio. É dever dos fiéis se perguntarem se o lugar que frequentam é sério, se é religião ou se é um esquema de extorsão. Daí a importância de saber para onde vai o dinheiro. O fiéis devem contribuir com suas igrejas mas também precisam conhecer o destino do que é doado.

Revista Muito - Como o senhor vai comemorar este ano o nascimento dele?

Frei Betto - Costumo celebrar a data com a minha comunidade dominicana. Fazemos uma comemoração na data, mas, as vezes, passo em Minas Gerais com minha família. Este ano, vou estar junto a comunidade. Na verdade, em dezembro, sou convidado a participar de celebrações natalinas, então, termino passando todo o mês sintonizado com essa energia
de celebrar a vida de Jesus. Gosto muito de fazer isso, especialmente quando estou entre amigos.

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